Ana Garcia: A mente visionária do Coquetel Molotov

Em entrevista exclusiva ao Papo Pop, Ana Garcia revela os bastidores e os desafios de criar um dos festivais mais inovadores do país.

Referência na produção cultural independente do país, Ana Garcia é um nome que pulsa junto com a música e a arte. À frente do Coquetel Molotov — um dos festivais mais inovadores e respeitados do Brasil — e da Coda Produções, Ana tem sido uma voz essencial na descentralização da cultura nacional, levando visibilidade para artistas, projetos e iniciativas criativas do Nordeste.

Com mais de duas décadas de atuação e reinvenções, ela tem pavimentado um caminho que inspira, conecta e transforma realidades.

Em entrevista exclusiva ao Papo Pop, Ana falou sobre sua trajetória, os desafios de se fazer cultura fora do eixo, os bastidores do Coquetel Molotov e as novidades que estão chegando à Paraíba com o projeto Coquetel Molotov Negócios.

Foto: divulgação.

Confira o papo completo:

Quem é a Ana por trás do festival? Como a cultura e a música entraram na sua vida?

Sou filha de dois músicos incríveis: o Maestro Rafael Garcia e a pianista Ana Lúcia Altino. Cresci cercada de música, arte e criação. Minha mãe teve um papel fundamental na cena clássica da Paraíba — fundou o Departamento de Música da UFPB e a Orquestra Sinfônica da Paraíba nos anos 80. Ainda assim, achava que meu caminho seria na medicina.

Passei um tempo nos EUA com minha mãe, que fez o doutorado em piano lá — foi a primeira nordestina a conquistar esse título. Foi nessa fase que mergulhei na MTV e descobri o rap, o pop, o alternativo… Voltei com um olhar muito mais amplo para a música e fui me reencontrando. Na faculdade, acabei cursando jornalismo e conhecendo as pessoas com quem fundei o Coquetel Molotov. A Ana por trás do festival é esse misto de backstage e palco, de clássico e pop, de intuição e resistência.

Como surgiu a ideia de criar o Coquetel Molotov?

A ideia nasceu na faculdade. Meus amigos já tinham o programa de rádio e me chamaram porque eu tinha discos raros que trouxe dos EUA. Quando meus pais assumiram a orquestra em Campinas, surgiu a vontade de criar uma plataforma para seguir colaborando mesmo à distância. Assim nasceu o site, depois o festival.

 

Foto: divulgação.


Nos inspiramos muito no Festival Virtuosi, dos meus pais, e sentimos a necessidade de um espaço para música independente e contemporânea no Nordeste. Trouxemos logo o Teenage Fanclub na primeira edição! Foi ousado, mas foi o começo de tudo.

Quais foram os maiores desafios nessa jornada?

Captação de recursos. Sempre foi o maior desafio — e ainda é. Fazer um festival independente no Nordeste, com propostas inovadoras, é nadar contra a maré. A distribuição de verba cultural no Brasil ainda é muito desigual.

No começo, tínhamos pouquíssimo recurso. Hoje, os desafios mudaram: são mais técnicos, de estrutura, de gestão de equipes maiores. Mas a luta por financiamento nunca deixou de existir.

Quais edições ou momentos mais marcaram sua vida?

Cada edição deixa sua marca, especialmente as mais difíceis. A de 2005 foi bem ousada: uma noite com Dungen, outra com The Kills — parecia distante da vibe de Recife na época.

A de 2014 foi dura: vinha de um processo judicial e fiz tudo sem recursos. Já 2015 foi mágica — curti com minha filha Letícia, que tinha 4 anos, e consegui aproveitar o festival de um jeito leve. 2016 foi caótica de tão cheia. E 2024 também foi especial: conseguimos captar, trouxemos a Pabllo Vittar e entregamos um festival potente em um ano difícil para a cena.

Foto: divulgação.

Como funciona a curadoria do festival?

É um quebra-cabeça. Escutamos muito o público, observamos a cena e buscamos sempre artistas que provoquem, que dialoguem com o agora. É um mix de novidade com exclusividade.

Hoje, temos parcerias como a IDLIBRA no palco KMKAZE, e quero abrir mais esse processo futuramente. Quanto mais olhares, mais potente fica a curadoria.

Quais são as novidades para as próximas edições?

Temos duas grandes novidades: a data do Coquetel Molotov em Recife já está confirmada — 6 de dezembro — e, em breve, vamos anunciar uma segunda data… Mas ainda é segredo!

E o Coquetel Molotov Negócios? O que o público pode esperar?

O Negócios nasceu da vontade de aproximar artistas e o mercado. Trazer curadores, produtores e compradores para conhecerem a cena do Nordeste, que muitas vezes não consegue viajar para outras regiões.

Foto: divulgação.

Na Paraíba, a proposta é fortalecer o que já existe. Em Campina Grande, o foco são as quadrilhas juninas. Em João Pessoa, a cena independente. Teremos oficinas, debates, pitchings e showcases — tudo pensado para gerar conexões reais e oportunidades concretas.

Qual o papel dos festivais como o Coquetel Molotov na cultura local e nacional?

Festivais como o nosso são espaços de afirmação. Dão visibilidade a artistas fora do mainstream, fomentam a economia criativa, formam público.

É também um gesto político: valorizar o que é feito no Nordeste, mostrar que não é exceção, é vanguarda. A cada edição, tentamos provar que é possível fazer cultura potente longe dos grandes centros.

Que conselho você daria para quem sonha em trabalhar com produção cultural?

Tenha um propósito. Não dá pra pensar só no formato ou no line-up. Pergunte-se: “Por que isso precisa existir?”

Construa uma rede, seja persistente e curioso. Trabalhar com cultura é resistência. Pode começar pequeno — o importante é começar.

O que ainda te inspira a continuar?

O processo. Eu amo montar esse quebra-cabeça, costurar ideias, pensar em experiências. Cada ano busco um novo desafio: um palco diferente, uma ação social, uma curadoria nova. É isso que mantém a chama acesa — a vontade de fazer diferente, de se reinventar.

Ana Garcia é, sem dúvida, uma das figuras mais influentes da cultura no Nordeste — e segue transformando o cenário musical com visão, coragem e paixão. O Coquetel Molotov é mais do que um festival: é um movimento que conecta, inspira e resiste.

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