O jardim onde brotam moedas e metáforas

Matheus Andrade deu uma entrevista para o Papo Pop sobre o lançamento do single “O Jardim do Dinheiro”

Há canções que nascem de dores profundas, outras que florescem da ironia cotidiana, e há aquelas que brotam, quase sem querer, de um gesto simples, lúdico e cheio de significados. “O Jardim do Dinheiro”, novo single do contrabaixista, produtor e compositor paraibano Matheus Andrade, é uma dessas últimas. Uma crítica suave, em forma de canção dançante, que finca suas raízes na cena inusitada de um punhado de moedas antigas jogadas no jardim de amigos.

 

Em entrevista ao Papo Pop, Matheus compartilhou o nascimento da canção:

“Essa música nasceu de uma cena inusitada. Fui visitar um casal de amigos em SP. Eles tinham acabado de fazer mudança. Assim que cheguei na casa deles, Marco estava com um saco de moedas antigas na mão. Num diálogo com a esposa, ele jogou o dinheiro no jardim. Aquilo virou a brincadeira principal dos dias em que fiquei por lá. Eu dizia que encontramos a solução ideal para os problemas financeiros da gente. Voltei para Jampa e compus a música.”

Foto: Agda Aquino.

Apesar de ter sido composta há mais de uma década, a faixa ressurge agora com um frescor atemporal.

“Acho o texto da canção atemporal. Parece fazer sentido a cada notícia sobre a economia brasileira. Não mudaria nada. Nem as expressões coloquiais da época”, afirma Matheus.

Com balanço entre o soul e a música brasileira, a nova gravação nasceu no home estúdio do artista. Ele reuniu músicos de sua confiança para dar vida ao arranjo: Tuca Andrade (teclados), Toni Silva (guitarra) e Flavinho Barreto (percussão).

Foto: Agda Aquino.

“Foi um exercício meticuloso e autoral em busca de algo leve e contemporâneo, para se ouvir no dia a dia.”

Um capítulo à parte nessa história é a participação afetiva de sua filha, que foi quem reacendeu o desejo do pai em compartilhar suas composições com o mundo.

“Minha filha tem sido uma força para voltar a acreditar nas músicas que componho. Ela pede para ouvir e ainda questiona o fato de não estar gravada. Toquei essa canção numa atividade na escola dela e os colegas até hoje cantam quando chego lá. Ela pediu para eu gravar. Aí aceitei o desafio, inclusive, o de cantar.”

A leveza da melodia não camufla a crítica.

“Espero que as pessoas se divirtam e até pensem na mensagem que, embora pareça uma brincadeira, tem uma reflexão. Essa busca eterna por riqueza acaba com o bem-estar de muita gente, né?”

Além de assinar a composição e cantar, Matheus também assumiu a produção musical, como já havia feito em seu álbum instrumental Por Baixo, de 2017.

“É algo que já venho fazendo há um bom tempo. Não é o ideal, mas é uma forma de autoria também. Até gosto!”

A mixagem e masterização ficaram por conta de Adriano Leão.

“Produzo minhas coisas com certos cuidados do início ao fim. A mixagem e masterização são etapas importantíssimas para definir a forma da música. Nesse quesito, Adriano já se tornou um parceiro em quem confio bastante.”

Matheus também falou sobre as novas dinâmicas do mercado fonográfico.

“As plataformas são, também, um espaço para darmos vazão às nossas composições, com o risco de pessoas gostarem do que fazemos. Adoro esse formato digital. Digo que o pré-save ajuda no engajamento da canção nas plataformas, além de ser um gesto de carinho das pessoas com quem quero partilhar minha música.”

Sobre possíveis próximos lançamentos, ele adianta:

O Jardim do Dinheiro é também uma proposta de identidade para um EP com mais 3 ou 4 músicas nesse estilo, a ser publicado, provavelmente, no próximo ano.”

Embora tenha um passado fortemente ligado à música instrumental, Matheus agora se vê diante de uma nova etapa. “Acho que estou iniciando uma nova fase: a de cantar o que componho. Para mim, é uma virada de chave.”

E quando o assunto é a cena musical de João Pessoa, o artista é enfático ao reconhecer a efervescência do cenário atual: “A conjuntura apresenta muitos artistas de qualidade e muitos espaços para os mais diversos tipos de música. Fazer música autoral é sempre uma batalha maior. E isso acontece hoje com mais expressão na cidade.”

Com alma de músico e olhar de poeta, Matheus Andrade transforma moedas esquecidas em metáforas poderosas. O Jardim do Dinheiro nos convida a plantar ideias no lugar de ansiedade, a regar reflexões com leveza e dançar, por que não, enquanto questionamos o valor que damos às coisas.