Sabiaras: quando a cultura nordestina encontra a força feminina no palco

Grupo paraibano fala sobre origens, representatividade e os próximos passos na carreira musical.

Elas surgiram como quem semeia um sonho coletivo e hoje já ocupam palcos importantes da cena cultural nordestina. O grupo Sabiaras, formado por Cecília, Waleska e Daiane, nasceu do desejo de resgatar e reinventar ritmos tradicionais do Nordeste, unindo-os a uma estética contemporânea e a uma presença de palco marcada pela representatividade feminina.

Quando sentimos que era real? Quando começamos a ser reconhecidas e a receber convites para nos apresentarmos sem sequer termos ido atrás dessas pessoas”, lembram.

O nome Sabiaras traduz a essência do projeto: uma figura híbrida, inspirada na natureza, que une o canto do sabiá, pássaro típico da Mata Atlântica, ao canto mítico da Iara, personagem das lendas brasileiras.

Foto: divulgação.

“Queríamos trazer essa força dos dois mundos: o popular e o lendário, o som da mata e o som das águas.”

Tradição e modernidade lado a lado

Foto: divulgação.

Com um repertório autoral e arranjos que misturam instrumentos acústicos e elétricos, as Sabiaras equilibram tradição e inovação.

“Nós estudamos os ritmos que queremos destacar e, a partir deles, acrescentamos outras sonoridades. Também tratamos de temas contemporâneos nas letras, o que traz modernidade ao nosso trabalho.”

O processo criativo é orgânico e livre:

“Precisamos estar abertas e inspiradas. Uma melodia ou verso surge, guardamos, e aos poucos vamos completando até nascer a música.”

Força feminina no palco

Em um cenário historicamente masculino, o trio assume um papel de resistência:

“É sinônimo de orgulho ocupar esses espaços. Queremos mostrar que não há diferença entre o toque de um homem e de uma mulher. Nosso show fala de enfrentamento e representatividade. A música Canto Resisto, por exemplo, é exatamente sobre isso: cantar e resistir.”

O público responde com entusiasmo, principalmente outras mulheres: “Elas elogiam, se identificam, se emocionam. Há sempre uma troca de energia muito forte.”

 

Nossa voz vai se espalhar

O show que carrega esse título resume a missão do grupo: “Queremos espalhar nossas vozes e as vozes de outras mulheres que lutam pelo seu reconhecimento artístico. É como o canto dos pássaros: ele ecoa, faça chuva ou faça sol, independente das barreiras.”

Momentos marcantes e novos passos

Entre as apresentações mais memoráveis, o trio destaca o show no picadeiro do Piolin, durante o I Encontro de Mulheridades Nordestinas do Circo:

“Foi uma troca intensa. Quantas mulheres incríveis reunidas, quanta energia boa.”

Elas também participaram do pitching do Festival Coquetel Molotov Negócios, um divisor de águas na trajetória da banda: “Foi a confirmação de que estamos no caminho certo.”

Agora, preparam novas músicas e prometem novidades: “Ainda não podemos revelar muito, mas será um trabalho com a cara das Sabiaras, pensado para o estúdio e para chegar às plataformas digitais.”

O futuro que cantam

O maior sonho coletivo? “Levar nossa música e nossa arte para outros estados do Brasil.” E se pudessem dividir o palco com qualquer artista nordestino, vivo ou ancestral? “Seria incrível cantar com Cátia de França e Chico César. E, se fosse possível, com a gigante Marinês.”

Entrevista completa com as Sabiaras

1. Como nasceu o grupo Sabiaras? Qual foi o momento em que vocês sentiram: “agora é real”?

Eu, Cecília e Waleska começamos a participar das oficinas das Calungas e lá conhecemos Daiane. A ideia do projeto já existia antes disso, não com o nome Sabiaras ainda (o nome veio depois) mas foi a partir dali que a gente conheceu pessoas que poderiam agregar e embarcar nessa ideia doida de fazer uma banda. E quando a gente sentiu que era real? Quando a gente começou a ser reconhecida, quando começamos a receber convites para nos apresentarmos em eventos e lugares sem a gente ter ido atrás dessas pessoas.

2. O nome “Sabiaras” tem uma sonoridade poética e forte. O que ele representa para vocês?

O nome representa uma figura híbrida, mitológica que faz referência a energia do ar, das águas e da natureza no geral. A gente queria trazer essa união de dois cantos fortes, o canto do sabiá que é o canto dos passarinhos da nossa área de mata atlântica e o canto da iara que está presente na nossa mitologia, dentro da nossa cultura popular.

3. O que uniu vocês três artisticamente e emocionalmente nesse projeto?

Acredito que artisticamente e emocionalmente o que nos uniu foi nosso amor pela cultura popular e pela cultura nordestina, essa vontade de querer conhecer mais nossas raízes e quem nós somos.

4. Vocês fazem um trabalho de resgate e reinvenção de ritmos nordestinos. Como equilibram tradição e modernidade na sonoridade da banda?

Nós estudamos os ritmos que queremos evidenciar na nossa música e juntamos a esses elementos característicos desse ritmo outras sonoridades como o violão e a guitarra, embora não nos limitamos a isso. Estamos abertas ao criativo. Além disso, as letras das nossas músicas autorais também trazem temas contemporâneos, trazendo essa modernidade.

5. Como funciona o processo de composição e criação de um show autoral nas Sabiaras?

Pro show a gente estuda sobre figurino, já pensamos sobre efeitos sonoros pra incluir no show. Pensamos sobre ideia de cenários. Muitas ideias vão surgindo e a gente vai testando. E depende muito de cada apresentação. Mas falando sobre a criação das músicas autorais, nosso processo de composição ainda é muito orgânico. Geralmente as composições são feitas por mim (Cecília) e por Waleska. Nós precisamos estar bem livres pra poder surgir uma letra ou uma melodia. Quando estamos inspiradas, surge uma ideia de uma letra, de uma melodia e guardamos isso. A medida que vai voltando a inspiração, nós vamos completando a letra ou o arranjo.

6. Que ritmos ou manifestações culturais do Nordeste mais mexem com o coração de vocês?

Sem dúvida as quadrilhas juninas que eu amo ver desde criança. As rodas de coco e ciranda, o maracatu, o forró no seu sentido mais amplo. Adoro ver aqueles grupos folclóricos dançando xaxado, gosto de ver os trios de forró. E eu acho que embora eu tenha visto pouco, ainda assim me encanta muito o cavalo marinho que é bem parecido com o reisado presente no Ceará com o qual Waleska teve mais vivência, tendo em vista ser sua terra natal.

7. Vocês são três mulheres multi-instrumentistas ocupando um espaço ainda muito masculino. Como é pra vocês subir no palco e romper essas barreiras?

É sinônimo de orgulho saber que estamos conquistando esses espaços. Faz parte do objetivo do projeto trazer essa representatividade. Queremos ver mais mulheres no palco. Queremos ver nossas artistas e musicistas em evidência.

8. A representatividade feminina é um eixo central do grupo. Como essa força se manifesta no som e na presença de palco de vocês?

Na presença de palco se manifesta no sentido da gente mostrar que não existe essa diferença entre o toque de um homem e de uma mulher. Nós queremos mostrar que precisamos dar mais espaço pras nossas artistas. E nossa música fala sobre resistência também, fala sobre enfrentar o julgamento alheio de cabeça erguida. Canto resisto (música autoral) fala justamente sobre isso.

9. Que tipo de reações vocês costumam receber do público, principalmente de outras mulheres?

São reações positivas. Já tivemos muitas mulheres elogiando a trabalho, a potência do show. Algumas ficam curiosas com os instrumentos. Mas graças à Deusa, geralmente são reações muito positivas. Sempre há uma troca de energia muito boa.

10. O show “Nossa Voz Vai se Espalhar” é um título potente. O que essa frase carrega de simbólico para vocês?

Exatamente o ela fala. Queremos espalhar nossas vozes. Não só a voz da banda, mas de outras mulheres que também estão na luta pelo reconhecimento, pelo seu valor artístico e queremos espalhar a voz das nossas raízes, da nossa cultura. E a frase é bem impositiva pra dizer que não é uma pequena pedrinha no meio do caminho que vai barrar esse som. Porque nossa voz, nosso canto ecoa e está se espalhando por aí como o canto dos pássaros, faça chuva ou faça sol, independente das barreiras.

11. Em pouco tempo, vocês já circularam por cidades da Paraíba e participaram de eventos importantes. Qual apresentação mais marcou até agora?

Apesar de termos feito vários shows, não só em João Pessoa, como em outras cidades em menos de um ano de banda, acredito que o show que mais nos marcou aconteceu no meio do picadeiro do Piolin, fazendo uma apresentação de fechamento do I Encontro de Mulheridades Nordestinas do Circo. Que energia foi aquela. Quantas mulheres incríveis se apresentaram nesse dia, conhecemos, sentimos. Foi uma troca incrível.

12. Como foi participar do pitching do Festival Coquetel Molotov Negócios? O que isso representou pra trajetória da banda?

Foi uma resposta de que estamos indo no caminho certo. Participar de um evento como esse entre tantos artistas incríveis, é motivo de se orgulhar e saber que estamos no caminho certo.

13. Vocês estão em processo de produção e lançamento de novas músicas. Podem dar um spoiler do que vem por aí?

Ainda não podemos dar muitos detalhes, mas com certeza vem coisa boa e diferente do que vemos no show. O processo de estúdio e bem diferente e com certeza teremos um trabalho incrível indo pro mundo, com a cara das Sabiaras, nas plataformas digitais, pra todo mundo ouvir.

14. Qual o maior sonho coletivo das Sabiaras?

Acredito que no momento nosso maior sonho é poder levar nossa música e nossa arte pra outros estados do Brasil.

15. Se pudessem dividir o palco com qualquer artista nordestino(a) — vivo ou ancestral — quem seria?

Nossa, foi difícil entrarmos em um acordo, pois são muitas inspirações. Com certeza seria incrível dividir o palco com a deusa Cátia de França e com nosso mestre Chico César. Mas se fosse possível também seria incrível poder dividir o palco com a gigante Marinês.