Ser artista independente no Brasil é um ato de resistência. Em um cenário em que a indústria fonográfica ainda concentra esforços em grandes estruturas e gravadoras, artistas como Indy provam que é possível trilhar uma jornada sólida com autonomia, coragem e criatividade. Cantora, compositora e produtora, ela já soma 10 singles lançados de forma independente, ultrapassando a marca de 500 mil plays no Spotify, e constrói um espaço próprio que mistura talento, ancestralidade e muita disciplina.
Nascida na Bahia e criada em Aracaju, Indy carrega em sua identidade artística as cores e os sons de dois territórios profundamente marcados pela diversidade cultural. O encontro dessas raízes pulsa em sua sonoridade, que transita entre o popular e o contemporâneo sem perder a essência da brasilidade.
“É um sonho fazer com que essas influências culturais dialoguem com a música produzida ao redor do mundo”, revela a artista, que tem investido em parcerias criativas para alcançar novos públicos.
A compositora que canta muitas vozes

Se como intérprete Indy ergue uma carreira independente consistente, como compositora ela já se consolidou como uma voz que ecoa em muitos timbres. Suas músicas foram gravadas por artistas de estilos distintos, de Mariana Aydar a Raphaela Santos, de Márcia Fellipe a Natanzinho Lima, além de nomes como Michele Andrade e Filhos de Jorge. Essa versatilidade comprova não apenas sua habilidade em escrever para diferentes gêneros, mas também sua paixão pelo Brasil e sua pluralidade.

Essa trajetória já lhe rendeu conquistas marcantes: em 2024, venceu o Prêmio Música do São João da Bahia com uma canção coassinada por ela; e em 2025, chegou ao Top 50 Brasil do Spotify, ocupando a 16ª posição com “Você Lembra”. São marcos que, segundo Indy, significam não apenas reconhecimento pessoal, mas também profissional, já que no meio artístico a comprovação de talento muitas vezes é medida pelos feitos conquistados.
Independência, coletividade e protagonismo feminino
Além de sua atuação artística, Indy é também produtora cultural e empreendedora criativa. À frente do projeto Salvador de Ponta a Ponta, realizado por dois anos consecutivos no Carnaval do Pelô, ela investe em iniciativas que não apenas movimentam a cena cultural, mas também ajudam a aproximar o público de suas próprias raízes.
Outro ponto essencial de sua caminhada é o engajamento na luta por maior representatividade feminina na música. A artista integra o projeto Escrito Por Elas, ao lado de Luana Matos, Tássia Morais e Lari Tavares, um coletivo de compositoras que fomenta espaços para mulheres no mercado musical. Ela também já colaborou com iniciativas como Som Por Elas (da Pagode Por Elas) e o HitDelas (da Hitlab). Para Indy, ampliar a presença das mulheres na indústria não é apenas uma questão de justiça, mas de enriquecer o próprio repertório cultural brasileiro.
“Conhecer compositoras como Chiquinha Gonzaga, Anastácia e Marília Mendonça me inspira a tornar as coisas melhores para quem vem depois”, explica.
Horizontes e sonhos
No curto prazo, Indy já trabalha em novos lançamentos: um EP em parceria com a Hitlab, a captação de recursos para um projeto formativo do Escrito Por Elas e parcerias inéditas que serão lançadas nas vozes de outros artistas. Mas, olhando mais adiante, seu maior sonho é ter uma discografia completa, capaz de registrar todas as histórias que escolheu contar.
Enquanto esse futuro chega, Indy segue se consolidando como um dos nomes mais promissores de sua geração, equilibrando sensibilidade, técnica e compromisso coletivo. Sua jornada mostra que ser independente não significa estar só: pelo contrário, é assumir a autoria da própria história enquanto abre caminhos para que outras vozes também possam florescer.
Entrevista com Indy na íntegra
1. Indy, você já soma 10 singles lançados de forma independente e mais de 500 mil plays no Spotify. Como tem sido construir sua carreira de forma autônoma e conquistar esse espaço no cenário musical?
É um desafio muito grande ser artista independente e lidar com a falta de estrutura, de pessoas e todas as outras demandas de construir uma carreira, mas ao mesmo tempo é uma oportunidade de se desenvolver em outras habilidades, honrar seu próprio ritmo e assumir mais responsabilidade por aquilo que você conquista ou não e ver, aos poucos, uma discografia sendo construída e esse espaço sendo conquistado é o combustível pra fazer ainda mais.
2. Você participou de projetos como Chá das Cinco com Indy, Festival Música Viva, Projeto Mentoria do PopLine e outros. Qual desses momentos foi um divisor de águas na sua trajetória até aqui?
Todos os projetos que participei despertaram em mim a força do coletivo e isso tem feito muita diferença no meu caminho, mas o Projeto Mentoria me colocou frente a frente com nomes de muita experiência no mercado quando eu tinha só dois anos de carreira. Esse momento me mostrou o quanto eu estava segura sobre elementos muito importantes pra a construção de uma carreira como meu posicionamento, meu discurso e a sonoridade que eu tava buscando e me deu forças pra me jogar ainda mais no mercado.
3. Sendo baiana criada em Aracaju, como essas duas culturas dialogam na sua música e na sua identidade artística?
Eu tenho muito orgulho dos lugares onde nasci e cresci e, ao longo da minha profissionalização na música durante alguns anos junto com o produtor musical Marcos Sena, pude entender o quanto as raízes culturais de onde eu venho são a base da minha musicalidade e da minha criatividade. Hoje, posso dizer que é um sonho fazer com que essas influências culturais dialoguem com a música contemporânea produzida ao redor do mundo e alcancem ainda mais gente.
4. Como compositora, você já foi gravada por artistas de diferentes estilos, de Mariana Aydar a Márcia Fellipe, passando por Raphaela Santos e Natanzinho Lima. O que essa versatilidade representa para você?
Eu sou uma pessoa completamente apaixonada pelo Brasil e sua pluralidade. Pelos nossos ritmos, nossa culinária, nosso jeito de falar e existir. Poder contar histórias como compositora de pontos de vistas diversos e abraçando também vários gêneros é uma oportunidade enorme de mergulhar ainda mais no que o nosso povo sente, pensa, vive e dança. Sou muito grata a todas as minhas parcerias de composição que me possibilitam essa versatilidade e me ensinam todos os dias.
5. Em 2024, você venceu o prêmio de Música do São João da Bahia e, em 2025, alcançou o Top 50 Brasil no Spotify com a música “Você Lembra”. O que significaram esses reconhecimentos para sua trajetória como compositora?
Existe a satisfação pessoal, de ser reconhecida pelas coisas que eu crio, de saber que aquilo impactou os momentos de muita gente que ouviu, mas existe também a importância profissional. Nesse meio a gente não usa currículo e quem trabalha com arte precisa provar sua capacidade o tempo todo, principalmente as mulheres e pessoas de outros grupos vulneráveis, então esses marcos são de certa forma comprovações de até onde eu já consegui ir, que podem ser vistas de um jeito mais prático e rápido.
6. Quando você escreve, pensa primeiro na sua própria interpretação ou já imagina a música sendo gravada por outros artistas?
Depende. Existem momentos em que eu componho por inspiração, por impulso criativo, mas quando você se torna uma compositora profissional é capaz de olhar para a sua carreira ou para a de um outro artista e entender as histórias que ele quer contar, as coisas que quer defender e faz de forma mais direcionada. Eu equilibro muito a inspiração com a rotina e a pesquisa, que me fazem evoluir como compositora e atender as oportunidades profissionais que surgem.
7. Você também atua como produtora cultural, à frente do projeto Salvador de Ponta a Ponta, realizado no Carnaval do Pelô em dois anos consecutivos. O que te move a estar nesses bastidores da cultura além dos palcos?
O Salvador de Ponta a Ponta é um projeto de muito valor, que foi idealizado junto com Marcos Sena e erguido por muita gente talentosa. O que me move é exatamente a oportunidade, para mim, para todos que trabalham nele e para o próprio público de se apropriar mais da cultura e dos lugares da nossa cidade. Muita coisa a gente consome sem saber de onde veio, e eu acredito que o projeto contribui com esse papel de mostrar de onde vem a musicalidade e alguns outros elementos da cultura baiana, além de proporcionar um showzão muito gostoso de curtir.
8. Que aprendizados você leva desse trânsito entre ser artista, compositora e produtora?
Um grande aprendizado que eu vejo é o poder de iniciativa, aprender a capacidade de fazer acontecer aquilo que você quer realizar, mas existem vários outros como aprender a se organizar e planejar melhor, a trabalhar em coletivo e a se adaptar a vários cenários e possibilidades.
9. Além da sua carreira, você também fomenta a cena da indústria musical com mulheres. Como surgiu esse compromisso de fortalecer a presença feminina nesse mercado?
Surgiu entendendo o quanto de desigualdade ainda existe nesse meio, mesmo com tantos avanços, e o quanto uma presença maior das mulheres nesse mercado traz benefícios não só para elas, mas também para todo o público que vai consumir as nossas narrativas e possivelmente se inspirar na nossa forma de conduzir as carreiras. Conhecer um pouco mais da história também me impulsionou muito. Entender o quanto compositoras como Chiquinha Gonzaga, Anastácia e mais recentemente Marília Mendonça tornaram as coisas melhores pra mim me faz querer tornar as coisas melhores pra quem vem também.
10. Quais projetos você já realizou ou participou que tinham como objetivo abrir espaço para mulheres na música?
O Escrito Por Elas é o principal projeto do qual faço parte nesse sentido. É por meio da união com Luana Matos, Tássia Morais e Lari Tavares (que teve a ideia do grupo) que me fortaleço como compositora, que aprendo todos os dias e que me sinto ainda mais motivada para, junto com elas, contribuir com a inserção de outras mulheres no mercado. Outros projetos que posso citar são a plataforma Som Por Elas (da Pagode Por Elas) e o HitDelas (da Hitlab).
11. Na sua visão, quais são os maiores desafios que as mulheres ainda enfrentam na indústria musical hoje?
A dúvida sobre a nossa capacidade em relação a colegas homens, a desigualdade na remuneração e o acesso a determinados espaços, principalmente de gerenciamento, são o que mais observo ao meu redor, mas tenho tentado mapear muitos outros.
12. O quanto a sororidade e a colaboração entre mulheres podem transformar o cenário artístico?
Acho que isso é algo imensurável. Não consigo descrever o quanto é importante se sentir compreendida, segura e impulsionada para quem trabalha com expressão, com vulnerabilidade e muitas vezes com exposição. As mulheres podem realmente fazer a diferença umas pelas outras e ocupar ainda mais espaços de uma forma saudável e mais coletiva.
13. Que mensagem ou conselho você deixaria para jovens compositoras, cantoras e produtoras que sonham em seguir carreira na música?
Ria mais das suas ideias. Das que você achar que são ruins e principalmente das que te disserem que são ruins. Quanto mais você olhar com naturalidade pras suas ideias ruins, mais espaço você consegue abrir pra que as boas cheguem e mais prazer no caminho você consegue encontrar.
14. O que podemos esperar da Indy nos próximos meses? Há novos lançamentos ou parcerias a caminho?
Tem novidades por vários lados! Estou em processo de gravação do meu EP em parceria com a Hitlab, em fase de captação de recursos para um projeto de formação do Escrito Por Elas para compositoras e tem composições muito interessantes que serão lançadas nas vozes de outros artistas.
15. E olhando lá na frente: qual é o seu maior sonho artístico, aquele que ainda não realizou, mas que te move todos os dias?
Ter uma discografia lançada! Quero muito poder olhar pra trás e ver que consegui botar no mundo as histórias que eu quis contar.