Elon: a personificação do novo pop paraibano

Entre o sertão mítico e as estéticas globais, Elon ergue uma obra que transverbera afetos, política e modernidade, consolidando-se como a nova sonoridade do pop nordestino.

Elon é, sem exagero, o novo pop do Nordeste. Sua arte não se limita a melodias, mas transborda como uma força de identidade, resistência e afeto. É música que pulsa no corpo e reverbera na alma, atravessando fronteiras geográficas e emocionais. Em meio a tantas vozes que ecoam no cenário nacional, Elon se distingue como a nossa turmalina Paraíba: rara, preciosa, luminosa e inconfundível, capaz de refletir múltiplas cores em uma sonoridade única que une sertão e contemporaneidade, tradição e vanguarda.

Foto: Kecia Andrade

No espetáculo “Transverberar”, título de seu próximo álbum a ser lançado em 2026, Elon se coloca como canal de energia criativa. A palavra carrega em si o sentido de atravessamento, de permitir que a luz penetre e se manifeste. Não à toa, o artista vê nesse gesto uma experiência de redenção e plenitude, em que amor e política se entrelaçam como fios inseparáveis de sua obra. Elon dança, canta e vibra para que o público se deixe também atravessar, compartilhando uma experiência de libertação e cura coletiva.

Foto: Kecia Andrade

Sua obra nasce do sertão paraibano, mas nunca se fecha em si mesma. Pelo contrário, é justamente da raiz que surge a expansão. Elon acredita que quanto mais original e local é uma criação, mais universal se torna. E é nesse trânsito entre a oralidade ancestral e as telas dos celulares, entre a seresta e o rock’n’roll, entre o imaginário sertanejo e a estética global, que ele encontra o seu lugar. Como tantos marcos da música brasileira, da Tropicália ao Manguebeat, do forró reinventado por Lucy Alves às ousadias de Totonho e Jaguaribe Carne, Elon inscreve sua trajetória na linhagem de quem transforma, renova e reposiciona o Nordeste como vanguarda.

Foto: Elon no Coquetel Molotov Negócios.

Mas sua canção não nasce apenas de referências históricas ou movimentos culturais. Elon compõe da vida cotidiana: de uma conversa no WhatsApp, de um gesto simples na rua, de um lampejo durante uma caminhada ao entardecer. É desse universo aparentemente banal que ele lapida sentimentos em forma de música, criando canções que conseguem ser ao mesmo tempo acessíveis e profundas. Seu pop é paradoxal e, por isso mesmo, fascinante: ancestral e futurista, festivo e político, urbano e místico.

Foto: Bruna Dias.

A circulação de “Transverberar” por cidades como João Pessoa, Pocinhos e Pombal adquire contornos simbólicos. Na capital paraibana, cidade que hoje o acolhe, Elon integra parcerias e projeta seu trabalho para um público diverso. Em Pocinhos, estreia no palco do Teatro Sebastião Vasconcelos, reafirmando sua força no agreste. Mas é em Pombal, sua terra natal, que a emoção se torna rito de origem: cantar no Cine Teatro Murarte, espaço construído por sua família, é como devolver à comunidade a arte que dela nasceu. É retorno, reencontro e celebração.

 

E se o presente já brilha, o futuro se anuncia com potência. 2026 será o ano do primeiro álbum solo de Elon, um trabalho gestado com garra e fé, feito na independência, sem gravadora, mas com a força de uma equipe inteiramente paraibana. É um gesto político e estético: mostrar que a Paraíba não é apenas consumidora, mas criadora de obras de excelência, capaz de dialogar de igual para igual com a cena nacional e internacional.

Foto: Elon no Coquetel Molotov Negócios.

No palco, Elon não é apenas intérprete: é corpo em êxtase, canal de energia e de esperança. Sua performance, descrita como quente, intensa e sensível, busca despertar no público mais do que a fruição estética — ela convida a sonhar coletivamente com um mundo sem exclusão, sem violência, com mais ternura e mais afeto.

 

A felicidade é um direito primordial, e toda Fulô merece encontrar o seu lugar de plenitude”, afirma.

Elon é, portanto, mais do que um artista emergente: é a materialização de um Nordeste que se reinventa, que honra sua ancestralidade e a projeta para o futuro. Como a turmalina Paraíba, ele irradia em múltiplas tonalidades, revelando ao Brasil e ao mundo que do sertão brota não apenas resistência, mas também o brilho mais raro e precioso da música contemporânea.

 

Confira a entrevista na íntegra:

-O título do show, TRANSVERBERAR, carrega um sentido de atravessamento, de deixar-se tocar e ser afetado profundamente. Para você, o que significa se transverberar no processo criativo e na vida? Esse atravessamento é mais um gesto de entrega íntima ou um convite para que o público também se deixe atravessar pela experiência da sua música?

TRANSVERBERAR significa reluzir, deixar a luz atravessar. Escolhi esse título tanto por uma das canções que integram esse trabalho quanto pela sensação que ela me causa de forma intuitiva, algo como uma redenção. Tem a ver com a sensação que quero transmitir com o show e com o álbum desse projeto (que está a caminho). Penso que o que mais comunica com o público nesse trabalho é o fato de tratar de emoções humanas, o amor também como um ato político. O que eu mais gostaria de sentir e transmitir é a sensação de plenitude, convidando o público a dançar e também alimentando reflexões. A felicidade é um direito primordial, e “toda Fulô merece…” encontrar o seu lugar de plenitude.

-Sua obra parte do sertão como paisagem afetiva, cultural e simbólica, mas também se abre a sonoridades contemporâneas e globais. Como você enxerga esse trânsito entre raízes e modernidade? E de que forma esse diálogo constante entre o local e o universal se torna parte da sua identidade artística?

Ouvi em algum momento que quanto mais original e local for um trabalho, mais universal ele é. Isso porque os signos que permeiam a cultura de um lugar carregam histórias que atravessam a história cultural do mundo e foram transmitidas de diversas formas: pela oralidade, pelas artes e também pelas telas dos celulares. O compartilhamento de informações está a todo vapor, modificando nossa percepção de mundo. Isso reflete na estética do que entregamos com novas técnicas e possibilidades.

Isso não é novidade na música brasileira. O Brasil é um país muito rico e diverso, sabe compreender as transformações globais e como devolvê-las, criando novas histórias, tendências, ritmos e sensações. Basta pensar em movimentos como o Tropicalismo, o Manguebeat, o Funk, a música do Norte… Aqui na Paraíba, Jaguaribe Carne foi e é escola. É também sobre Lucy Alves, abrindo um outro lugar estético no forró. É também sobre Totonho. Eu também caminho nesse sentido de transformação e penso que é uma forma de reverberar uma identidade que não é só minha, mas de todo um povo. Fazer música a partir do meu lugar geográfico e de fala me faz pensar que também posso contribuir com a renovação da música nordestina, que historicamente sempre esteve na vanguarda.

-Muitos dizem que você representa o novo pop da Paraíba para o mundo. Esse pop que você constrói parece acolher contradições: é ancestral e futurista, festivo e político, místico e urbano. De que forma você traduz essas múltiplas camadas em canções que conseguem ser ao mesmo tempo acessíveis e profundas?

Compor é uma forma de resolver um sentimento, se dedicando às palavras e à melodia. Aí eu vou brincando com as ideias, que podem chegar de qualquer lugar: de uma conversa de mesa de bar, do WhatsApp ou de alguma reflexão repentina quando faço caminhada no fim da tarde. Não faço muito alarde para aparecer, mas também é um processo que requer lapidação. Está de mãos dadas com a comunicação, né? Sem ela, aonde vai?

-A circulação do espetáculo por cidades como João Pessoa, Pocinhos e Pombal tem sentidos diferentes, principalmente quando você retorna à sua cidade natal. O que esses territórios significam para você e como dialogam com sua trajetória? Existe uma diferença entre cantar para o público que acompanha sua carreira em grandes centros e cantar para a comunidade que conhece suas origens?

Esse curto circuito de setembro está sendo especial pela oportunidade de passar por três cidades em regiões diferentes da Paraíba. João Pessoa é a cidade que me acolhe hoje e é onde me apresento com mais frequência. Fizemos a “Noite do Auge” na Vila do Porto, em parceria com Nathalia Bellar e as produtoras Anabi Pinheiro e Luiza Oliveira.

Em Pocinhos, no agreste, tive a satisfação de cantar pela primeira vez no Teatro Municipal Sebastião Vasconcelos, um espaço importante com realização do Centro Cultural Banco do Nordeste – Sousa. Também será especial em Pombal, ainda mais porque será no quintal da minha casa, no Murarte, espaço desenvolvido por minha família. Para mim, é simbólico poder voltar nesse momento e cantar no lugar que me criou. Estou completando 32 anos e preparando um disco. Lá é a origem do que sou no mundo.

Esse show em Pombal também finaliza o projeto aprovado pela Bolsa Funarte de Música Pixinguinha, que realizou nosso show também em Manaus-AM (no Bloco da Cobra Grande) e em São Paulo, na programação noturna da SIM SP, através do PARAHYBRIDAS.

Esse tem sido um período de fortalecer a consistência do projeto, com a oportunidade de chegar a diversos espaços, apresentar o repertório do álbum que está por vir e encontrar novas conexões. Amo esse processo e agradeço. Mas cantar em casa tem uma emoção diferente; o coração bate mais forte numa ansiedade boa de sentir. Estarei entre pessoas amigas.

-No espetáculo, o corpo é parte essencial da narrativa. Não apenas a voz ou os instrumentos, mas o corpo como presença cênica, política e espiritual. De que maneira ele se torna veículo de criação e comunicação com o público? Você considera que o corpo também carrega a memória coletiva e, portanto, canta junto com você?

Uma boa e bonita pergunta. Cada parte do corpo e cada forma de movimentar (ou não) guarda as memórias que fazem nossa forma de existir no mundo. E cada corpo carrega a sua própria trajetória, suas limitações, sua envergadura. O corpo é político quando assume o seu lugar, e o público inevitavelmente se conecta com as diferenças, as semelhanças e a plenitude de um corpo em movimento. O palco é sagrado porque é um momento de constatação plena de que só existe o agora entre artista e público. Quando o corpo tá pra jogo, o som da voz sai com mais confiança e naturalidade. O público acessa suas memórias, porque o intérprete em cena também acessa às suas.
Embora possa não parecer, eu sempre fui uma pessoa tímida, com o tempo a gente vai encontrando um jeito e entendendo cada momento de um roteiro musical. O figurino também favorece a criatividade e o improviso. Gosto de utilizar elementos cênicos nesse show e tenho utilizado uma máscara de crânio pintado de dourado como amuleto de proteção.

-Suas composições falam de emoções humanas, do imaginário amoroso e também de questões sociais urgentes. Como equilibrar a delicadeza do afeto com a contundência das denúncias? Existe para você um ponto em que amor e política se encontram dentro da mesma canção?

O palco é o lugar da beleza e também da denúncia. Acredito muito no poder que a arte tem de provocar as consciências ou propor perspectivas melhores de sociedade. Seja falando de amor ou política, existe um contexto histórico e social que nos atravessa e interfere no que está sendo dito pela canção e como. A arte deixa de ser somente por ela e passa a refletir o imaginário e às necessidades de um momento, um grupo, uma comunidade. Tudo é política, inclusive os afetos.nesse sentido, a delicadeza e a contundência não estão distantes. A música e o silêncio são também posicionamentos. Além disso, a poesia abre caminhos pra que a arte não incorra no risco de ser meramente panfletária.

-Sua performance no palco tem sido descrita como quente, intensa e sensível, um mergulho de energia e emoção. O que você busca despertar no público em cada apresentação? Você acredita que a música pode ser uma experiência de cura coletiva ou de transformação interior?

Acredito que a música, quando feita com verdade, gera um deslumbre, um delírio de prazer e uma transformação, sim. Ela se relaciona com o contexto no qual está inserida. Quando estou no palco, sou canal. Através da arte, também busco uma cura, uma esperança. A apresentação é um momento de partilha dessa esperança.

O mundo anda cada vez mais apressado, e precisamos refletir sobre questões psicológicas, políticas e sociais para resolvê-las. Ainda vivemos na era das imagens. A busca aqui é utilizar o espetáculo para projetar um mundo sem exclusão e violência. Uma utopia, talvez. Mas quando a gente sonha coletivamente, chega mais perto da realidade.

-Pensando no futuro, com o lançamento do álbum previsto para 2026, quais caminhos você deseja abrir com a sua arte? Que impacto espera gerar, não apenas na sua carreira, mas também na cena musical brasileira e no público que se conecta com a sua obra?

2026 está logo ali e vem chegando com novidades. Nesse trabalho, existe uma potência que já vem se revelando desde que começamos a trabalhar esse repertório publicamente. De certa forma, a turnê do disco já começou, e fico muito feliz em ver que o público já está aprendendo a cantar as músicas antes do lançamento. Isso me traz a expectativa de que será um disco bastante ouvido e compartilhado.

Embora eu já tenha outros trabalhos lançados, “Transverberar” será o meu primeiro álbum solo. Está sendo preparado com muito amor, e quero entregá-lo da melhor forma possível. Preciso dizer que este trabalho é feito na garra e na fé que precisa ter quem é artista independente. Não tenho contrato com gravadora no momento e sou minha própria empresa. Isso me coloca muitos desafios. Por ser fruto do meu próprio trabalho com a música, me provoca muita empolgação.

É um projeto desenvolvido a partir da Paraíba, com equipe totalmente paraibana. Nosso estado tem uma tendência de valorizar mais produtos artísticos de fora, e um dos meus objetivos é mostrar à Paraíba que temos potência para realizar trabalhos excelentes. Penso que a importância desse projeto está na expectativa de poder contribuir para que a Paraíba esteja presente nos movimentos atuais da música e, indo mais fundo, na presença do sertão nordestino na música pop brasileira.

Hoje ouço como está ficando o trabalho e me sinto inteiramente ali (a sensação de plenitude que falei). Em breve, estará no mundo, nos fones de ouvido e nas caixinhas de som que esse trabalho alcançar. Boto muita fé no som.